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sábado, 20 de março de 2010
ESPERO POR TI NESSE INFINDÁVEL AZUL
Fresca brisa que finalmente me levarias,
este sopro de alma ,longínqua e calada
e sempre de perto de mim ter-me-ias
leve, sem voz, sem tom, sem nada...
Hoje mesmo, se viesses a mim chorando,
o quão delicadamente, eu te abraçaria...
tua presença frágil como uma duna ao vento
com as minhas mãos ternamente te acariciaria
JP
ALEGORIA
- No campo de amoras
quem será que mora?
- ora, por que perguntas agora?
- é que ouvi o canto, lá fora
do vento a sussurrar nos ouvidos
de uma doce amora
- Estás a ouvir absurdos
ouves estrelas a cantar na aurora
amoras têm ouvidos surdos
e lá naquele campo ninguém mora
- então, são ilusões dos sentidos
quiçá esquecê-las melhora
meu devaneio perdido
minhas lembranças de outrora
por certo, é tempo já ido
outro dia, outra hora
outros beijos dormidos
em outros braços, outros lábios
outra senhora.
JP
A MÚSICA
A música p'ra mim tem seduções de oceano!
Quantas vezes procuro navegar,
Sobre um dorso brumoso, a vela a todo o pano,
Minha pálida estrela a demandar!
O peito saliente, os pulmões distendidos
Como o rijo velame d'um navio,
Intento desvendar os reinos escondidos
Sob o manto da noite escuro e frio;
Sinto vibrar em mim todas as comoções
D'um navio que sulca o vasto mar;
Chuvas temporais, ciclones, convulsões
Conseguem a minh'alma acalentar.
— Mas quando reina a paz, quando a bonança impera,
Que desespero horrivel me exaspera!
Charles Baudelaire, in "As Flores do Mal"
É OUTONO...
Outono...
Estação do amor duradouro...
Apesar da efemeridade das folhas,
Resta-nos a perpetuação das sementes...
Outono...
Tempo de fenecer
As folhas que aparentam secas
Expiram de amor para renascer!
A brisa suave acaricia meu rosto
Desperta sentimentos de ternura e beleza
Clarim luminoso do sol
Beija as flores adormecidas
É outono com certeza!!!
RUAS DE OUTONO
Nas ruas de outono
Os meus passos vão ficar
E todo abandono que eu sentia vai passar
As folhas pelo chão
Que um dia o vento vai levar
Meus olhos só verão que tudo poderá mudar
Eu voltei por entre as flores da estrada
Pra dizer que sem você não há mais nada
Quero ter você bem mais que perto
Com você eu sinto o céu aberto
Daria pra escrever um livro
Se eu fosse contar
Tudo que passei antes de te encontrar
Pego sua mão e peço pra me escutar
Seu olhar me diz que você quer me acompanhar
Eu voltei por entre as flores da estrada
Pra dizer que sem você não há mais nada
Quero ter você bem mais que perto
Com você eu sinto o céu aberto
Quero ter você bem mais que perto
Com você eu sinto o céu aberto...
Composição: Ana Carolina/ Antonio Villeroy
DIA DE OUTONO
Senhor, é tempo! O estio foi bem grande.
No relógio solar pousa tua sombra,
a pela pradaria o vento expande.
Amadurece a fruta derradeira:
dá-lhe dois dias mais meridionais
em que se aperfeiçoe, e exige o mais
doce sabor à pejada videira.
Quem não tem casa, agora, não a faça;
se há alguém sozinho, assim deve ficar
a ler ou longas cartas rascunhar,
nas alamedas onde inquietos passa
enquanto as folhas tremem soltas no ar.
Rainer Maria Rilke
CANÇÃO DE OUTONO
Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.
De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o própro coração?
E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando áqueles
que não se levantarão...
Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...
Cecília Meireles
É OUTONO
É outono... a mágica estação do ano em que a natureza revela um especial esplendor. Calmamente vou adentrando a alameda de plátanos dourados. Um tapete amarelo-avermelhado espalha-se a meus pés, por onde sigo pisando calmamente, num vagar calculado, com o firme propósito de saborear esses momentos de pura e encantadora magia...
Folhas de outono...
Nas árvores, nos ares, no chão.
Folhas de outono em sua derrareira e incomparável glória, exalando um aroma adocicado, de flutuante despedida.
Folhas de outono a cair dolentes, num bailar dourado, esvoaçantes, ternas, doces, displicentes, espalhando pelos ares pingos multicores – pálidos, marrons, rubros, nacarados, cintilantes, diferentes e diversos como os sentimentos humanos, que transitam numa vasta gama - eterna e densa - que vai da apatia à paixão intensa.
Prossigo, relembrando os melancólicos outonos que já vivi...
As diferentes primaveras que vivenciei – ternas, intensas, fortes, coloridas...
E os verões... Quantos verões ardentes, sedentos, apaixonantes...
Meu olhar repousa sobre uma dessas pequeninas folhas de outono, que insiste em permanecer no ar, como se ainda lhe restasse uma leve esperança de não esmorecer de vez no chão úmido, salpicado por centenas de outras folhinhas em decomposição, já se entregando ao ciclo implacável da natureza.
Da mesma forma, meu solitário ser, após vivenciar tantos férteis ciclos da existência humana, sente estar chegando ao derradeiro outono da vida. E tenta agarrar-se a um fio de esperança, insistindo em usufruir os derradeiros prazeres mundanos, como aquela pequenina folha, na esperança de retardar ao máximo a queda final.
A folhinha, finalmente, repousa sobre o chão. De repente, não a percebo mais; ela misturou-se aos infinitos outros pontos amarelos do chão de outono... entregou-se a seu inevitável destino de participar do processo de transformação da natureza, para um dia retornar em alguma paisagem, fazendo-me lembrar que
a vida se move em ciclos
de fazer e desfazer,
que sentimentos arrefecem,
que ardentes paixões esfriam,
que toda glória é efêmera...
mas que os ciclos favorecem
o renascer da esperança
– e esse, sim, é duradouro... é eterno
em todos os corações humanos...
Oriza Martins
sexta-feira, 19 de março de 2010
NA DANÇA
TUDO PASSA II
O coração não morre: ele adormece...
E antes morresse o coração traído,
Mulher que choras teu amor perdido,
Amor primeiro que não mais se esquece!
Quando tu vais rezar, quando anoitece,
Beijas as contas do colar partido;
E o coração n'um trêmulo gemido
Vem perturbar a paz de tua prece.
Reza baixinho, ó noiva desolada!
E quando, à tarde, pela mesma estrada
Chorando fores esse imenso amor...
Geme de manso, juriti dolente!
Vais acordar o coração doente...
Não o despertes para nova dor.
Auta de Souza
TUDO PASSA I
Aquela moça graciosa e bela
Que passa sempre de vestido escuro
E traz nos lábios um sorriso puro,
Triste e formoso como os olhos dela...
Diz que su'alma tímida e singela
Já não tem coração: que o mundo impuro
Para sempre o matou... e o seu futuro
Foi-se n'um sonho, desmaiada estrela.
Ela não sabe que o desgosto passa
Nem que do orvalho a abençoada graça
Faz reviver a planta que emurchece.
Flávia! nas almas juvenis, formosas,
Berço sagrado de jasmins e rosas,
O coração não morre: ele adormece...
Auta de Sousa
LÁ LONGE ATRÁS DA MONTANHA
Minha alegria é tamanha
Qu'eu quedo-me para ver:
Tanta e tão grande beleza,
Que só mesmo a natureza
Me poderia oferecer...
As searas ondeando,
Trigos loiros, sasonados
De papoilas salpicados,
De um vermelho rutilante,
São pinceladas vibrantes
De um quadro feito: Matisse;
Escuto a brisa que passa
Em seu estranho rumor,
Como se de Orfeu se tratasse
Cantando a Euridisse
As suas trovas de amor.
O ar cheira a rosmaninho,
A jasmim, a alfazema...
A vida é todo um poema
Que me apetece viver!
JP(meu caderninho)
quinta-feira, 18 de março de 2010
CREPUSCULAR
Há no ambiente um murmúrio de queixume,
De desejos de amor, d'ais comprimidos...
Uma ternura esparsa de balidos,
Sente-se esmorecer como um perfume.
As madressilvas murcham nos silvados
E o aroma que exalam pelo espaço,
Tem delíquios de gozo e de cansaço,
Nervosos, femininos, delicados.
Sentem-se espasmos, agonias d'ave,
Inapreensíveis, mínimas, serenas...
--- Tenho entre as mãos as tuas mãos pequenas,
O meu olhar no teu olhar suave.
As tuas mãos tão brancas d'anemia...
Os teus olhos tão meigos de tristeza...
--- É este enlanguescer da natureza,
Este vago sofrer do fim do dia.
Camilo Pessanha
RUI VELOSO - Não Há Estrelas No Céu -
Não há estrelas no céu a dourar o meu caminho,
Por mais amigos que tenha sinto-me sempre sozinho.
De que vale ter a chave de casa para entrar,
Ter uma nota no bolso pr'a cigarros e bilhar?
A primavera da vida é bonita de viver,
Tão depressa o sol brilha como a seguir está a chover.
Para mim hoje é Janeiro, está um frio de rachar,
Parece que o mundo inteiro se uniu pr'a me tramar!
Passo horas no café, sem saber para onde ir,
Tudo à volta é tão feio, só me apetece fugir.
Vejo-me à noite ao espelho, o corpo sempre a mudar,
De manhã ouço o conselho que o velho tem pr'a me dar.
Vou por aí às escondidas, a espreitar às janelas,
Perdido nas avenidas e achado nas vielas.
Mãe, o meu primeiro amor foi um trapézio sem rede,
Sai da frente por favor, estou entre a espada e a parede.
Não vês como isto é duro, ser jovem não é um posto,
Ter de encarar o futuro com borbulhas no rosto.
Porque é que tudo é incerto, não pode ser sempre assim,
Se não fosse o Rock and Roll, o que seria de mim?
Composição: Carlos Tê / Rui Veloso
INTERROGAÇÃO
Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar,
Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;
E apesar disso, crê! nunca pensei num lar
Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.
Por ti nunca chorei nenhum ideal desfeito.
E nunca te escrevi nenhuns versos românticos.
Nem depois de acordar te procurei no leito
Como a esposa sensual do <>.
Se é amar-te não sei. Não sei se te idealizo
A tua cor sadia, o teu sorriso terno...
Mas sinto-me sorrir de ver esse sorriso
Que me penetra bem, como este sol de inverno.
Passo contigo a tarde e sempre sem receio
Da luz crepuscular, que enerva, que provoca.
Eu não demoro o olhar na curva do teu seio
Nem me lembrei jamais de te beijar na boca.
Eu não sei se é amor. Será talvez começo...
Eu não sei que mudança a minha alma pressente...
Amor não sei se o é, mas sei que te estremeço,
Que adoecia talvez de te saber doente.
Camilo Pessanha
METADE
ASA NO ESPAÇO
Asa no espaço, vai, pensamento!
Na noite azul, minha alma flutua!
Quero voar nos braços do vento,
Quero vogar nos braços da Lua!
Vai, minha alma, branco veleiro,
vai sem destino, a bússola tonta...
Por oceanos de nevoeiro
corre o impossível, de ponta a ponta.
Quebra a gaiola, pássaro louco!
Não mais fronteiras, foge de mim,
que a terra é curta, que o mar é pouco,
que tudo é perto, princípio e fim.
Castelos fluídos, jardins de espuma,
ilhas de gelo, névoas, cristais,
palácios de ondas, terras de bruma,
... Asa, mais alto, mais alto, mais!
Fernanda de Castro
A CASA DO LAGO
Devolvem o limo à fresca terra
Como o lago escurecido a côr das nuvens
Assim devolvo ao lago os meus olhos
Ouvindo os cantos de sereias de outrora
Do tempo dos palácios que sonhara
Há segredos ondulantes na maré
Nas brisas que desfraldam velas gastas
O Sol arrasta um novo milénio de Saudades
A baía da casa dos meus sonhos
Encruzilhada de partida e de regresso
Num lago de cor plúmbea e agreste
Assim partem de novo as Esperanças
Assim regressa o Sol ao Coração
Deixo no lago estas lembranças
Que serão limo dos futuros que virão.
JP
quarta-feira, 17 de março de 2010
A MINHA CANÇÃO
Minha canção te envolverá com sua música, como os abraços sublimes do amor.
Tocará o teu rosto como um beijo de graças.
Quando estiveres só, se sentará a teu lado e te falará ao ouvido.
Minha canção será como asas para os teus sonhos e elevará teu coração até o infinito.
Quando a noite escurecer o teu caminho, minha canção brilhará sobre ti como a estrela fiel.
Se fixará nos teus lindos olhos e guiará teu olhar até a alma das coisas.
Quando minha voz se calar para sempre, minha canção te seguirá em teus pensamentos.
R. Tagore
ELIS REGINA
Elis Regina de Carvalho Costa nasceu em 17 de março de 1945 em Porto Alegre, RS.
Foi, sem dúvida, a maior cantora brasileira de todos os tempos.
Com técnica e garra, lançou alguns dos principais compositores brasileiros, como João Bosco e Aldir Blanc, Renato Teixeira, Fátima Guedes - só não lançou Chico Buarque porque resolveu pensar sobre o assunto - Nara Leão foi mais rápida.
A "pimentinha", como era chamada, tinha - como João Gilberto - a perfeição como meta.
Exigia muito de seus músicos e compositores, exigia de sua gravadora, exigia de sua voz.
Ganhávamos nós, o público.
Não foi sempre assim - quando veio do Rio Grande do Sul tentou carreira no Rio de Janeiro - não foi pra frente. Seus primeiros discos são repletos das exigências da mídia, Elis teve que cantar o que vendia na época.
Transferindo-se para São Paulo, encontrou a cidade de braços abertos. Foi aqui que Elis chegou a perfeição, e foi aqui que se transformou numa tradição.
Elis virou São Paulo, que a acolheu e a recolheu, quando se foi aos 36 anos, em 19 de janeiro de 1982.
Foi a primeira pessoa que inscreveu sua voz como instrumento, na Ordem dos Músicos do Brasil. E era.
A voz de Elis soava como instrumento afinado, não perdendo, nem por um minuto, o carisma e a emoção em cada canção. Envolveu-se com tudo de forma radical - com a música, com a política, com a vida. Maldita para muitos, Elis tinha sempre a frase certeira, a mente afiada, propósitos firmes: "Cara feia pra mim é bode... Sou mais ardida que pimenta!".
CICLO
Manhã. Sangue em delírio, verde gomo,
Promessa ardente, berço e liminar:
A árvore pulsa, no primeiro assomo
Da vida, inchando a seiva ao sol... Sonhar!
Dia. A flor, - o noivado e o beijo, como
Em perfumes um tálamo e um altar:
A árvore abre-se em riso, espera o pomo,
E canta à voz dos pássaros... Amar!
Tarde. Messe e esplendor, glória e tributo;
A árvore maternal levanta o fruto,
A hóstia da idéia em perfeição... Pensar!
Noite. Oh! saudade!... A dolorosa rama
Da árvore aflita pelo chão derrama
As folhas, como lágrimas... Lembrar!
Olavo Bilac
ENTÃO É VOCÊ
Então é você
que bem antes de mim
diz o que eu queria dizer
tão bem quanto eu diria.
E quem diria?
ainda melhor
Acho que teu nome é poesia
e por isso todos te chamam
Então é você
tua simples presença
preenche a minha existência
me faz ver o que eu não via.
E quem diria?
ainda melhor
Acho que teu nome é vida
e por isso todos te querem
Então é você
que quando fala
instala a compreensão
de tudo que eu seria.
E quem diria?
Ainda melhor
Acho que teu nome é amor
e por isso todos te amam
E quando todos te chamam
quem sou eu pra não chamar?
E quando todos te querem
quem sou eu pra não querer?
E porque todos te amam
“eu sei que vou te amar
-ALICE RUIZ-
terça-feira, 16 de março de 2010
EM CADA NOVO OUTONO...
Sempre que for Outono, eu estarei lá,
Nas velhas folhas mortas e douradas,
No murmúrio das árvores cansadas
No sol a despedir-se: - Eu volto já!
Há lágrimas no céu, de vez em quando,
E o vento vai gemendo de mansinho...
É o Tempo a preparar o seu caminho
Ao Natal que se vai aproximando.
São crianças as tardes e manhãs.
As noites, a crescer, são como irmãs
No eterno labutar da nossa vida...
Em cada novo Outono, eu lá estarei
Cantando esse Natal que preparei
Nas horas que aqui vivo de fugida...
Maria João Brito de Sousa
MÁGOAS
Quando nasci, num mês de tantas flores,
Todas murcharam, tristes, langorosas,
Tristes fanaram redolentes rosas,
Morreram todas, todas sem olores.
Mais tarde da existência nos verdores
Da infância nunca tive as venturosas
Alegrias que passam bonançosas,
Oh! Minha infância nunca teve flores!
Volvendo à quadra azul da mocidade,
Minh'alma levo aflita à Eternidade,
Quando a morte matar meus dissabores.
Cansado de chorar pelas estradas,
Exausto de pisar mágoas pisadas,
Hoje eu carrego a cruz das minhas dores!
Augusto dos Anjos
(in Eu – 1912)
EU PENEIRO O ESPÍRITO E CRIVO A CÍTARA
Eu peneiro o espírito e crivo o ritmo
Do sangue no amor, o movimento para fora
O desabrigo completo. Peneiro os múltiplos
Sentidos da palavra que sopra a sua voz
Nos pulsos. Crivo a pulsação do canto
E encontro
O silêncio inigualável de quem escuta
Eis porque as minhas entranhas vibram de modo igual
Ao da cítara
Eu peneiro as entranhas e encontro a dor
De quem toca a cítara. A frágil raiz
De quem criva horas e horas a vida e encontra
A corda mais azul, a veia inesgotável
De quem ama
Encontro o silêncio nas entranhas de quem canta
Eis porque o amor vibra no espírito de quem criva
O músico incompleto peneira a ideia das formas
Eu sopro a água viva. Crivo
O sofrimento demorado do canto
Encontro o mistério
Da cítara
Daniel Faria, in "Dos Líquidos"
A LIÇÃO DA POESIA
Toda a manhã consumida
como um sol imóvel
diante da folha em branco:
princípio do mundo, lua nova.
Já não podias desenhar
sequer uma linha;
um nome, sequer uma flor
desabrochava no verão da mesa:
nem no meio-dia iluminado,
cada dia comprado,
do papel, que pode aceitar,
contudo, qualquer mundo.
A noite inteira o poeta
em sua mesa, tentando
salvar da morte os monstros
germinados em seu tinteiro.
Monstros, bichos, fantasmas
de palavras, circulando,
urinando sobre o papel,
sujando-o com seu carvão.
Carvão de lápis, carvão
da idéia fixa, carvão
da emoção extinta, carvão
consumido nos sonhos.
A luta branca sobre o papel
que o poeta evita,
luta branca onde corre o sangue
de suas veias de água salgada.
A física do susto percebida
entre os gestos diários;
susto das coisas jamais pousadas
porém imóveis ? naturezas vivas.
E as vinte palavras recolhidas
nas águas salgadas do poeta
e de que se servirá o poeta
em sua máquina útil.
Vinte palavras sempre as mesmas
de que conhece o funcionamento,
a evaporação, a densidade
menor que a do ar.
(João Cabral de Melo Neto)
segunda-feira, 15 de março de 2010
EU TE AMO
Sim eu te amo; porém nunca
saberás do meu amor;
a minha canção singela
traiçoeira não revela
o prêmio santo que anela
o sofrer do trovador!
Sim, eu te amo; porém nunca
dos lábios meus saberás,
que é fundo como a desgraça,
que o pranto não adelgaça,
leve, qual sombra que passa,
ou como um sonho fugaz!
Aos meus lábios, aos meus olhos
do silêncio imponho a lei;
mas lá onde a dor se esquece,
onde a luz nunca falece,
onde o prazer sempre cresce,
lá saberás se te amei!
E então dirás: "Objeto
fui de santo e puro amor:
A sua canção singela,
tudo agora me revela;
já sei o prêmio que anela
o sofrer do trovador.
Amou-me como se ama a luz querida,
como se ama o silêncio, os sons, os céus,
qual se amam cores e perfumes e vida,
os pais e a pátria, e a virtude e a Deus!"
(Antônio Gonçalves Dias)
RESPIRAÇÃO
Não minto nem digo a verdade
Sou como o vento que sopra
e a chuva que cai.
Sou a luz que ao anoitecer
devolve claridade.
Sou como as escadarias
que aparecem nos sonhos:
um clarão entre degraus,
uma sombra entre dois passos,
uma nuvem esbraseada.
Sou como a erva que cresce
e o frio que une os corpos.
Não falo nem silencio.
Desperto para sonhar.
Não respondo nem interrogo.
Apenas respiro
junto ao dia que nasce.
Lêdo Ivo
In Crepusculo Civil
SEDUÇÃO
A poesia me pega com a sua roda dentada,
me força a escutar imóvel
o seu discurso esdrúxulo.
Me abraça detrás do muro, levanta
a saia pra eu ver, amorosa e doida.
Acontece a má coisa, eu lhe digo,
também sou filho de Deus,
me deixa desesperar.
Ela responde passando
língua quente em meu pescoço,
fala pau pra me acalmar,
fala pedra, geometria,
se descuida e fica meiga,
aproveito pra me safar.
Eu corro ela corre mais,
eu grito ela grita mais forte.
Me pega a ponta do pé
e vem até na cabeça,
fazendo sulcos profundos.
É de ferro a roda dentada dela.
Adélia Prado
In Bagagem
SIMPLES
A vida em palavras simples
Não tão simples como a vida
Nem é simples procurar
Simples palavras para uma vida
Tão simples como o amor
Feroz como o sentimento
sem a moléstia de sofrer na dor
humildade no arrependimento
Conhecer a simplicidade
no próprio sentido bom
não interessa a idade
de sentir tão sentido dom
Na forma de um ser
No carinho de dar
Liberta-te ao amanhecer
Um simples gesto para mudar
JP
domingo, 14 de março de 2010
HISTÓRIA - Fatos registrados Através Da Fotografia - Parte II
1957. O primeiro dia de Dorothy Counts na escola Harry Harding, nos EUA. Ela foi uma das primeiras estudantes negras aceitas na escola e não aguentou o assédio após 4 dias.
Photo credit: Douglas Martin, USA
1963. Thich Quang Duc, O padre Budista, no sul do Vietnã, queimou a si mesmo até a morte protestando contra a tortura do governo, sofrida pelos padres. Ele não se mexeu ou emitiu qualquer som enquanto se queimava.
Photo credit: Malcolm W. Browne, USA
1962. Um soldado que tomou um tiro de um atirador de elite segura-se em um padre em seus últimos momentos,
Photo credit: Héctor Rondón Lovera, Venezuela
1965. Uma mãe com seus filhos tenta atravessar o rio no Vietnã do sul, na tentativa de fugir das bombas americanas.
Photo credit: Kyoichi Sawada, Japan
1966. Tropas americanas arrastam um soldado vietcong morto.
Photo credit: Kyoichi Sawada, Japan
1 de fevereiro, 1968. Chefe Polícia do sul do Vietnã Nguyen Ngoc Loan atira em um jovem que ele suspeita ser um vietkong.
Photo credit: Eddie Adams, USA
1972. Depois dos Aviões do sul do vietnã "ACIDENTALMENTE" soltarem uma bomba numa cidade.
Photo credit: Ut Cong Huynh, Vietnam
1973. Poucos segundos antes do presidente eleito do Chile Salvador Allende ser morto durante o golpe.
Photo credit: Unknown photographer
1975. Uma mulher e uma garota caindo depois que a escada de incêndio quebrou.
Photo credit: Stanley Forman, USA
HISTÓRIA - Fatos Registrados Através Da Fotografia - Parte I
1980. Uma criança em Uganda prestes a morrer de fome e um missionário.
Photo credit: Michael Wells, U.K.
23 de fevereiro de 1981. A polícia do Coronel Molina fecha o prédio do parlamento na espanha. O fotógrafo não esperava a cena e escondeu o filme em seu sapato.
Photo credit: Manuel Pérez Barriopedro, Spain
1992. Uma mãe na somáliasegura o corpo de seu filho, que morreu de fome.
Photo credit: James Nachtwey, USA
1994.Um homem que foi torturado por soldados por ser suspeito de falar com os rebeldes Tutsi.
Photo credit: James Nachtwey,
1996. Crianças chocadas e mutiladas pela guerra em Angola
Photo credit: Francesco Zizola, Italy
2001. O corpo do filho de um afegão sendi preparado para o funeral, no Paquistão.
Photo credit: Erik Refner, Denmark
2002. Soldados e habitantes de uma vila no Irã estão cavando sepulturas para as vítimas do terremoto. Um garoto segura as calçcas dos pais antes que o enterrem.
Photo credit: Eric Grigorian, USA)
2003. Um prisioneiro de Guerra Iraquiano tenta acalmar seu filho
Photo credit: Jean-Marc Bouju, France
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