VISITANTES
sábado, 10 de julho de 2010
O LAGO
Dos bosques o lago azul,
teto de douradas flores,
embala o sonho de um barco
em alvíssimos tremores.
À sua margem passeio,
e esperando-a, espreito;
vê-la surgir de entre as flores
e terna vir ao meu peito.
- Saltemos ao barco, então,
e que as ondas nos alentem,
e deixemos que seus remos
sejam ramos indolentes.
Naveguemos docemente
Sob o clarão do luar;
suspire o vento nos juncos,
ponha-se a água a cantar... -
Mas ela não vem...Sozinho,
debalde sofro de amores,
à margem do lago azul,
teto de douradas flores.
Mihai Eminescu (1850-1889)
RÉPLICA
O Poeta
Tu és uma onda, sou um horizonte,
Eu sou uma margem, tu és o mar,
Amada minha.
A Amada
Tu és um rei, sou uma rainha,
Eu sou um caos, tu és uma luz,
Sou uma harpa molhada ao vento –
Tu és um canto.
O Poeta
Tu és a fronte, sou um diadema,
Olho os teus olhos, te adivinhando –
Sei que te amo.
A Amada
Pareço a noite , sou qual segredo,
molhada veste, pálida sombra,
uma canção sublime e quieta –
Tudo o que é místico, ó bardo amado,
nesta minha alma que por ti arde,
de tudo, tudo, o nada é meu –
É tudo teu.
Mihai Eminescu (1850-1889)
TENHO AINDA UM DESEJO
Ainda um desejo:
tarde a findar,
deixai que eu morra
à beira-mar.
Um sono calmo
no bosque ameno
vizinho às águas
e ao céu sereno.
Não quero tumba,
mas dai-me um leito
de tenras ramas.
Ninguém deplore
minha viagem,
mas traga o outono
voz à folhagem,
enquanto as fontes
caiam constantes
e brilhe a lua
nas altas frondes...
Luzes que nascem
das sombras lindas,
sendo-me amigas,
serão benvindas,
E o mar gemendo
seu aspro canto...
Eu serei terra,
Sozinho ...e quanto!
Mihai Eminescu (1850-1889)
TESTEMUNHO DO TEU SILÊNCIO
Lanças sobre o deserto da satifsção
Lençois de ternura
Sonhos esperando certezas
Emprenhando a descrença no adorno da afliçãao
Para embalar no berço da tua alma
Os negros dias sorrindo `
Sem que possas esquecer
Lava na memória
Os teus olhos da vergonha
Sem outro percurso
Contorcendo-se no fogo do amanhã
Sem que possas escapar
Libertas tua dor
Em fios....
Como nascente do desagrado
Testemunho do teu silêncio.
by Jorge Pereira
sexta-feira, 9 de julho de 2010
SUGISMUNDO
Sujismundo, um personagem sujo, cheio de maus hábitos, que apareceu em comerciais dos anos 70.
LIMITE DO AMOR
Condenado estou a te amar
nos meus limites
até que exausta e mais querendo
um amor total, livre das cercas,
te despeças de mim, sofrida,
na direção de outro amor
que pensas ser total e total será
nos seus limites de vida.
O amor não se mede
pela liberdade de se espor nas praças
e bares, sem empecilho.
É claro que isto é bom e , às vezes,
sublime.
Mas se ama também de outra forma,incerta,
e este o mistério:
- ilimitado o amor às vezes se limita,
proibido é que o amor às vezes se liberta.
A.Romano de Sant'Anna
ODE PARA O FUTURO
Falareis de nós como de um sonho.
Crepúsculo dourado. Frases calmas.
Gestos vagarosos. Música suave.
Pensamento arguto. Subtis sorrisos.
Paisagens deslizando na distância.
Éramos livres. Falávamos, sabíamos,
e amávamos serena e docemente.
Uma angústia delida, melancólica,
sobre ela sonhareis.
E as tempestades, as desordens, gritos,
violência, escárneo, confusão odienta,
primaveras morrendo ignoradas
nas encostas vizinhas, as prisões,
as mortes, o amor vendido,
as lágrimas e as lutas,
o desespero da vida que nos roubam
- apenas uma angústia melancólica,
sobre a qual sonhareis a idade de oiro.
E, em segredo, saudosos, enlevados,
falareis de nós - de nós! - como de um sonho.
Jorge de Sena
VIDA EM LIBERDADE
Os sons que esta manhã me abordam
são música, melodias que as aves me dão,
são hinos de vontade que com o dia acordam,
gritando que são apenas o que são.
E porque precisam de ser mais?
Se regem a vida pela liberdade,
se seguem em paz pelo mundo dando sinais
de que vivem de mãos dadas em igualdade.
Pudesse eu, esta manhã juntar num poema
os voos, os cantos, as cores, a fantasia
e o mundo deixaria de viver neste dilema
onde o sorriso parece viver em agonia.
Respiram a aragem fresca em céu aberto
e voam em sintonia no ar num elo forte,
riscam no espaço um rumo certo,
onde a vida existe por vontade e não por sorte.
Ah, vivo e vibro de extrema felicidade,
por esta dávida que a vida esta manhã me deu
de poder ver correr a vida em liberdade,
na esperança de que alguém a veja como eu!
Fernanda Rocha Mesquita
SOLIDÃO DO TEMPO
quinta-feira, 8 de julho de 2010
COMO UM ADEUS...
REFLEXÃO
Ao escrever contei as penas
Da minh'alma amargurada;
Não são grandes, nem pequenas,
São as minhas, só, mais nada.
No papel pus o sentido
Dado às coisas desta vida;
Nunca o tempo foi perdido
Por ser gasto nesta lida.
Talvez quem, um dia, leia
O que escrevo, nesta hora,
Sinta o mesmo que eu, agora.
Depois de uma vida cheia
De trabalhos e desgostos,
Quem deseja ter opostos?
VITOR CINTRA
ABRO-ME
Abro-me!
E, olhando o céu,
me vou,
ave sem asas
ao sabor da aragem
que o pensamento me sopra,
inconstante e leve,
rumo ao azul;
Mergulho infinito
ao meu eu interior.
E já não estou!
E já não sou
senão a projecção do longe,
que absorve a distância,
se repete,
e se perde no esquecimento.
E, sendo eu,
de novo,
Fecho-me!
VITOR CINTRA
quarta-feira, 7 de julho de 2010
A MINHA VIDA É UM BARCO ABANDONADO
A minha vida é um barco abandonado
Infiel, no ermo porto, ao seu destino.
Por que não ergue ferro e segue o atino
De navegar, casado com o seu fado?
Ah! falta quem o lance ao mar, e alado
Torne seu vulto em velas; peregrino
Frescor de afastamento, no divino
Amplexo da manhã, puro e salgado.
Morto corpo da ação sem vontade
Que o viva, vulto estéril de viver,
Boiando à tona inútil da saudade.
Os limos esverdeiam tua quilha,
O vento embala-te sem te mover,
E é para além do mar a ansiada Ilha.
Fernando Pessoa
QUASE
Um pouco mais de sol - eu era brasa.
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
...
Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...
Mário de Sá Carneiro
terça-feira, 6 de julho de 2010
A LUZ QUE VIBRE
SONETO DO AMOR DIFÍCIL
A praia abandonada recomeça
logo que o mar se vai, a desejá-lo:
é como o nosso amor, somente embalo
enquanto não é mais que uma promessa…
Mas se na praia a onda se espedaça,
há logo nostalgia duma flor
que ali devia estar para compor
a vaga em seu rumor de fim de raça.
Bruscos e doloridos, refulgimos
no silêncio de morte que nos tolhe,
como entre o mar e a praia um longo molhe
de súbito surgido à flor dos limos.
E deste amor difícil só nasceu
desencanto na curva do teu céu.
David Mourão-Ferreira
segunda-feira, 5 de julho de 2010
NOSSO TEMPO
SERENIDADE
A palidez do dia é levemente dourada.
O sol de inverno faz luzir como orvalho as curvas
Dos troncos de ramos Secos.
O frio leve treme.
Desterrado da pátria antiquíssima da minha crença,
Consolado só por pensar nos deuses,
Aqueço-me trémulo
A outro sol do que este.
O sol que havia sobre o Parténon e a Acrópole
O que alumiava os passos lentos e graves
De Aristóteles falando.
Mas Epicuro melhor
Me fala, com a sua cariciosa voz terrestre
Tendo para os deuses uma atitude também de deus,
Sereno e vendo a vida
À distância a que está.
Ricardo Reis
JANELA DO SONHO
Abri as janelas
que havia dentro de ti
e entrei abandonado
nos teus braços generosos.
Senti dentro de mim
o tempo a criar silêncio
para te beber altiva e plena.
Mil vezes
repeti teu nome,
mil vezes,
de forma aveludada
e era a chave
que se expunha
e fecundava dentro de mim.
Já não se sonha,
deixei de sonhar,
o sonho é poeira dos tempos
é a voz da extensão
é a voz da pureza
que dardejava na nossa doçura.
Quando abri as tuas janelas
e despi teus braços
perdi a vaidade
e a pressa,
amei a partida
e em silêncio abri,
(sem saber que abria)
uma noite húmida
em combustão secreta
desmaiado no teu ombro
de afrodite.
Carlos Melo Santos
MARCEL MARCEAU
Marcel Mangel, mais conhecido como Marcel Marceau ou Mime Marceau (Estrasburgo, 22 de março de 1923 — Cahors, 22 de setembro de 2007).
Mímico mais popular de todo o mundo. Foi o responsável em reviver esta arte no período pós-guerra.
Mímico mais popular de todo o mundo. Foi o responsável em reviver esta arte no período pós-guerra.
domingo, 4 de julho de 2010
ALQUIMIA
SILÊNCIO E SOMBRA
O HOMEM QUE CONTEMPLA
Vejo que as tempestades vêm aí
pelas árvores que, à medida que os dias se tomam mornos,
batem nas minhas janelas assustadas
e ouço as distâncias dizerem coisas
que não sei suportar sem um amigo,
que não posso amar sem uma irmã.
E a tempestade rodopia, e transforma tudo,
atravessa a floresta e o tempo
e tudo parece sem idade:
a paisagem, como um verso do saltério,
é pujança, ardor, eternidade.
Que pequeno é aquilo contra que lutamos,
como é imenso, o que contra nós luta;
se nos deixássemos, como fazem as coisas,
assaltar assim pela grande tempestade, —
chegaríamos longe e seríamos anónimos.
Triunfamos sobre o que é Pequeno
e o próprio êxito torna-nos pequenos.
Nem o Eterno nem o Extraordinário
serão derrotados por nós.
Este é o anjo que aparecia
aos lutadores do Antigo Testamento:
quando os nervos dos seus adversários
na luta ficavam tensos e como metal,
sentia-os ele debaixo dos seus dedos
como cordas tocando profundas melodias.
Aquele que venceu este anjo
que tantas vezes renunciou à luta.
esse caminha erecto, justificado,
e sai grande daquela dura mão
que, como se o esculpisse, se estreitou à sua volta.
Os triunfos já não o tentam.
O seu crescimento é: ser o profundamente vencido
por algo cada vez maior.
Rainer Maria Rilke, in "O Livro das Imagens"
QUEM SONHA MAIS
Quem sonha mais, vais-me dizer —
Aquele que vê o mundo acertado
Ou o que em sonhos se foi perder?
O que é verdadeiro? O que mais será —
A mentira que há na realidade
Ou a mentira que em sonhos está?
Quem está da verdade mais distanciado —
Aquele que em sombra vê a verdade
Ou o que vê o sonho iluminado?
A pessoa que é um bom conviva, ou esta?
A que se sente um estranho na festa?
.
Alexander Search, in "Poesia"
MULHER
Ela deixou o sorriso guardado
numa gaveta da alma
e tentou colar o anel de cristal
com lágrimas e silêncio.
No lenço colocou a saudade,
na mala arrumou os retratos.
E viajou
no redemoinho
das emoções naufragadas.
Voltou depois do tempo
e ficou na gare,
sentada,
premeditando ausências.
Só o apito do trem
acompanhou sua tristeza
no olhar parado
de quem mais nada espera
porque tudo: - aconteceu!
Maria Alice Estrella
Assinar:
Postagens (Atom)