VISITANTES

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

NASCER DE NOVO


Nascer de novo

Nascer: fincou o sono das entranhas.
Surge o concreto,
a dor de formas repartidas.
Tão doce era viver
sem alma, no regaço
do cofre maternal, sombrio e cálido.
Agora,
na revelação frontal do dia,
a consciência do limite,
o nervo exposto dos problemas.

Sondamos, inquirimos
sem resposta:
Nada se ajusta, deste lado,
à placidez do outro?
É tudo guerra, dúvida
no exílio?
O incerto e suas lajes
criptográficas?
Viver é torturar-se, consumir-se
à míngua de qualquer razão de vida?

Eis que um segundo nascimento,
não advinhado, sem anúncio,
resgata o sofrimento do primeiro,
e o tempo se redoura.
Amor, este o seu nome.
Amor, a descoberta
de sentido no absurdo de existir.
O real veste nova realidade,
a linguagem encontra seu motivo
até mesmo nos lances de silêncio.

A explicação rompe das nuvens,
das águas, das mais vagas circunstâncias:
Não sou Eu, sou o Outro
que em mim procurava seu destino.
Em outro alguém estou nascendo.
A minha festa,
o meu nascer poreja a cada instante
em cada gesto meu que se reduz
a ser retrato,
espelho,
semelhança
de gesto alheio aberto em rosa.


Carlos Drummond de Andrade

2 comentários:

  1. A explicação rompe das nuvens,
    das águas, das mais vagas circunstâncias:
    Não sou Eu, sou o Outro

    Affff..........muito lindoooooooooooooo

    Beijos amigaaaaaaaaaaaa

    ResponderExcluir
  2. Belo poema. Uma reflexão que se torna um desafio, para a nossa vida aqui e agora, nascer de novo, para que a vida seja sempre nova de felicidade em cada hora, para nós e para os outros.

    ResponderExcluir